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O poder da luz

Iluminando o que quer destacar, criando sombras onde deseja esconder, o trabalho do light designer Guinter Parschalk tem o controle de como as pessoas vão fazer a leitura visual de um espaço.

POR MARTA DE DIVITIIS

“A primeira impressão que se tem da arquitetura é a da luz”, afirma Guinter Parschalk, um dos nomes à frente do Studio Ix, especializado em projetos luminotécnicos. O light designer sabe do que está falando, porque tem em seu portfólio os restaurantes Jamile e Bela Sintra, ambos em São Paulo; o quiosque Dufry, do Aeroporto Internacional de Guarulhos; o Museu da Fotografia, em Fortaleza (CE), entre outros projetos. “Para além da estética, a luz tem importância na questão do desempenho comportamental e funcional das pessoas”.

Recentemente, Guinter assinou um ambiente de estúdio na CasaCor 2023, em que preferiu manter o espaço do mezanino do Conjunto Nacional exatamente como é: com vigas de concreto, barras metálicas e tubulações aparentes. Ainda assim, conseguiu criar um clima acon- chegante e, ao mesmo tempo, artístico somente empregando efeitos da iluminação vermelha de luminárias estrategicamente dispostas no local.

Pendente Coordinates do designer Michael Anastassiadis é protagonista no ambiente

E esse trabalho corrobora com a frase que costuma pregar: o iluminador faz as pessoas virem as coisas do seu jeito, porque escolhe o que ressaltar ou o que deixar à sombra, editando a leitura visual de um espaço.

Quando foi convidado para assinar a iluminação do Hotel Unique, em São Paulo, o arquiteto Ruy Otake, responsável pelo projeto, disse que o cliente era uma pessoa jovem e que, por isso, queria muita criatividade. Mas um dos desafios foi definir como seria a iluminação da fachada, porque a forma de melancia do hotel é muito marcante. “Então, achei que o ideal não seria jogar uma luz chapada. Queria que fosse muito suave e que pudesse se movi- mentar não de forma virtual, mas de um modo orgânico”, lembra.

O paisagista desse projeto foi o Gilberto Elkis, que na concepção original criou um córrego suave, na frente, mas que era pouco árido, composto por pedras portuguesas. “Para dar essa organicidade, não queria um projeto que iluminasse diretamente. Aí tive a ideia de colocar uns projetores que iriam refletir a luz da água. Para isso, seria interessante que a água estivesse em movimento. Perguntei ao Elkis se seria possível fazer uma espécie de cascata para dar o movimento que eu queria e ele concor- dou”. Para colaborar para Guinter conseguir o efeito luminoso imaginado, o paisagista elaborou um percurso com um morrinho.

Hotel Unique projetado por Ruy Ohtake

“Colocamos três projetores com fachos de luz superprecisos de três graus apontados para a água. Parte do fundo era feita de material espelhado. Então a luz era refletida com um movimento variável, de acordo com a brisa e o vento”, explica.

Outro desafio do Hotel Unique foi fazer a iluminação da piscina. Guinter havia pensado em colocar um fundo espelhado para refletir a luz. Mais Ohtake quis fazer uma piscina usando pastilhas (tipo Vidrotil) cor de vermelho sangue. “O material era transparente. Colocamos, então, uma luz por trás em todo o perímetro no nível fora d’água e, por meio de fibra óptica, essa luz é transmitida através do mosaico de pastilhas”, explica o profissional, que criou uma das mais impactantes piscinas de São Paulo.

ALGUMAS CURIOSIDADES LUMINOSAS

  • ::  A luz mais amarelada, chamada luz quente, tende a ser mais aconche- gante, porque biologicamente induz
    à produção de melatonina, hormônio produzido na glândula pineal do cére- bro e que auxilia na definição do ciclo circadiano – mudanças físicas, mentais e comportamentais durante aproxima- damente 24h, afetadas pela incidência da luz – e regula o relógio biológico informando ao cérebro quando é hora de dormir e de acordar, proporcionan- do um estado de relaxamento.
  • ::  A luz neutra e fria, mais branca, esti- mula a produção de cortisol, hormônio produzido nas glândulas suprarrenais, que nos leva a um estado de alerta e que, quando produzido em excesso, induz ao estresse, fazendo com que a gente se mantenha acordado e atento.
  • ::  O ideal é não ficarmos apenas dispostos sob uma atmosfera de iluminação ou relaxante, ou só estimulante. O ideal é ter a flutuação da luz, de acordo com o momento. “Na hora do lazer ou do descanso, ter uma iluminação que induza ao relaxamento. E, quando tivermos a necessidade de produtividade, estado de alerta, ela deve ter intensidade e uniformidade maior, sem sombreamentos. Assim, para todos os lugares para o qual se olhe, é possível ter a mesma quantidade de luz”, ensina Rafael Sanches, arquiteto e light designer, que ministra aulas sobre o assunto no IPOG – Instituto de Pós-Graduação e Graduação.
  • :: O termo poluição luminosa expressa o skyglow, que envolve qualquer fonte noturna de luz difusa, entre elas, os efeitos adversos da luz artificial externa, o brilho luminoso celeste noturno, a luz intrusa (invasão da luz em espaços onde ela é indesejável ou desnecessária, como nas janelas dos dormitórios, por exemplo) e o ofuscamento desconfortável ou desabilitador, que significa a luz direta nos olhos – que pode danificar a retina. De acordo com Silvia Carneiro, lighting designer titular do escritório Íris Luminotécnica, os danos causados ao meio ambiente pela poluição luminosa são imensos. “Um deles é a chamada fotopoluição, luz na costa marítima, que afeta o desenvolvimento de ninhos das tartarugas marinhas, mata os recifes de corais e prejudica os movimentos migratórios dos pássaros”, explica a especialista. “A luz artificial, além de inibir a chegada das tartarugas na praia para a desova, confunde a orientação das tartarugas na volta

    à água: elas perdem a referência do brilho da luz da lua e das estrelas na água, e acabam indo em direção à iluminação artificial, sendo atropeladas e mortas por predadores”, explica.

O iluminador faz as pessoas virem as coisas do seu jeito, porque escolhe o que ressaltar ou o que deixar à sombra…

FOTOS MAYRA ACAYABA, MARCELO KAHN E DIVULGAÇÃO

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