Ao longo dos seus 35 anos, a CasaCor, a mais completa mostra de arquitetura, design de interiores e paisagismo das Américas, provocou mudanças profundas no nosso jeito de morar.
Por Livia Pedreira | Fotos: Rosa May, Carolina Szsbó, Clarice, Arquivo Pessoal, Alain Brugier, Salvador Cordoraro
Quando a CasaCor surgiu, há 35 anos, pouquíssimos brasileiros tinham acesso a profissionais como arquitetos e, principalmente, aos decoradores, nome pelo qual passaram a ser reconhecidos aqueles que se dedicavam a transformar os interiores das casas. A profissão de designer de interiores só seria reconhecida em 2016.
A arquitetura moderna brasileira, apesar de tão celebrada em todo o mundo entre as décadas de 1940 e 50 do século passado, era conhecida e cultuada apenas por um restrito grupo de intelectuais do país. O olhar de boa parte da elite brasileira se espichava para além-mar.
Para ela, importar estilos europeus, que, diga-se de passagem, já havia muito estavam fora de moda, ainda era considerado o suprassumo do bom gosto. Quatro décadas atrás, o único evento de importância para quem se importava com o bem-morar era a UD, Feira de Utilidades Domésticas, que exibia as maravilhas da indústria e suas promessas de revolucionar o dia a dia doméstico.
No início dos anos 1980, alguns showrooms passaram a exibir seu mobiliário em composições que simulavam ambientes domésticos.
No entanto, eventos e showrooms pecavam por não incorporar a suas composições a riqueza da diversidade de que o design brasileiro era capaz de entregar.
Engenhosa simplicidade
Foi nesse cenário que surgiu a CasaCor – uma iniciativa de duas mulheres visionárias (a argentina Angélica Rueda e a paulistana Yolanda Figueiredo) e seus dois sócios argentinos (Javier Malbran e Ernesto del Castillo). A ideia era de uma engenhosa simplicidade: selecionar e convidar os melhores profissionais do mercado para montar ambientes com toda a liberdade.
A adesão foi imediata. Afinal, onde mais eles poderiam mostrar o seu trabalho para os eventuais clientes, que pouco conheciam da sua arte? Junto com eles, embarcaram na iniciativa a indústria e o varejo de revestimentos, móveis, objetos de decoração. Com o sucesso da CacaCor, os visitantes passaram a contratar talentos revelados pelo evento, requisitando a indústria nacional voltada para o segmento.
Ao mostrar um loft pela primeira vez, há mais de duas décadas, o evento ditou moda e ampliou a carteira de ofertas do tradicional mercado imobiliário. E trouxe ideias avançadas para seu tempo, como o bar contêiner.
Pouco a pouco, o mobiliário assinado por nossos clássicos modernos, Oscar Niemeyer, Joaquim Tenreiro, Jean Gillon e Jorge Zalszupin, surgia em alguns projetos. A arte popular também ganhava destaque e encontrava na jornalista e editora Olga Krell, parceira de primeira hora da CasaCor, uma aliada de peso.
Esse viés de brasilidade produziu momentos memoráveis, como o resgate da tradicional parede de taipa de mão (agora inserida e em per- feita sintonia com ambientes sofisticadíssimos) e a presença, quase exclusiva, do mobiliário e do design made in Brazil nos ambientes de suas mostras. Abriu-se, assim, outro capítulo para que novíssimos arquitetos e designers passassem a criar produtos para a indústria.
Desse modo, a CasaCor conquistou o posto de plataforma reveladora de tendências e mostrou ser um excelente laboratório para testar e validar produtos e serviços. Hoje estamos em 18 capitais brasileiras, três cidades latino-americanas e em Miami.
Hub do morar
Nas últimas duas décadas e meia, a CasaCor cresceu e se consolidou como um potente hub da indústria do morar. E, ano a ano, vem revelando talentos, e muitos deles se tornaram profissionais de projeção internacional.
Como um sensível radar que capta o espírito do tempo, a CasaCor, a partir de 2015, passou a refletir sobre a complexidade dos novos tempos e voltou nosso olhar para a sustentabilidade – uma bandeira de peso, implementada ao longo desses últimos sete anos.
Em 2020, conquistamos a certificação Lixo Zero. Além disso, fomentamos a economia circular. Ou seja, vidro, gesso e chapas de madeira, entre outros materiais, foram reciclados e reutilizados por suas indústrias de origem. Também promovemos projetos em parceria com ONGs. Em 2016, erguemos a primeira casa construída de forma totalmente sustentável e autossuficiente em energia e continuamos a fazer ações pontuais e consistentes.
A inovação é a resposta
Há dois anos, a pandemia nos trancou em casa e tivemos que cancelar os eventos. Reagimos a esse desafio criando um inédito projeto, que unia o universo físico ao digital: o Janelas CasaCor. Profissionais do país foram convidados a refletir sobre a casa pós-pandemia e criar projetos para serem exibidos em vitrines, instaladas em contêineres vedados e apreciadas por quem passava por elas.
Já os ambientes internos só eram acessados por meio de um tour virtual, disponível em nosso site. A exposição, segura, inclusiva e gratuita, foi realizada em dez cidades do país. E ganhou uma versão totalmente digital em Miami.
Mesmo com o retorno dos eventos presenciais, o formato Janelas se mantém, para que a CasaCor possa estar em lugares que ainda não comportam o evento físico.
Nunca tivemos tanta intimidade com a nossa casa como nesse período pandêmico, nem tanta consciência de suas deficiências. Mais do que nosso refúgio, a casa assumiu o papel principal em nossa vida. Sempre dialogando com seu tempo, a CasaCor permanece sendo um campo fértil para responder a mais esse desafio.