AO FUNDAR SUA MARCA EM 2013, O DESIGNER CARIOCA GUSTAVO BITTENCOURT DECIDIU ASSUMIR A PRODUÇÃO E A VENDA DOS MODELOS. A LIBERDADE GARANTIDA POR ESSA FÓRMULA REFLETE-SE HOJE NUM PORTFÓLIO CHEIO DE PERSONALIDADE, INFLUENCIADO PELO MODERNISMO BRASILEIRO E DEFINIDO PELA PAIXÃO
Gustavo Bittencourt cresceu em uma casa onde havia móveis de Janete Costa, Sergio Rodrigues, Eero Saarinen, Harry Bertoia e Le Corbusier. Filho da arquiteta Cristina Bittencourt, era o primeiro a abrir e devorar as revistas especializadas em arquitetura e interiores que a mãe assinava. “Ela me estimulava a pintar, desenhar, brincar com argila, me levava a exposições de arte e mostras de decoração. Desde muito cedo, mergulhei nesse universo”, conta.
Optar pelo curso de desenho industrial foi, para ele, consequência natural da atmosfera que o cercava. “Cheguei a ficar em dúvida se preferia arquitetura, mas me senti atraído pelo design porque ele abre um campo muito grande de possibilidades.” Em 2003, aos 17 anos, Gustavo ingressou na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) ainda sem uma ideia clara de qual área abraçaria. Durante a faculdade, os professores incentivavam a participação em concursos de mobiliário, e logo nos primeiros em que se inscreveu, o então aluno acabou premiado. “Descobri que nasci para fazer isso, o que me deixa realizado. Nem todo mundo tem a mesma sorte.”
Entre o início da universidade e a abertura do Atelier Gustavo Bittencourt, passaram-se dez anos, período em que o designer atuou em marcenarias, metalúrgicas, no escritório de outros criadores e até em uma galeria especializada em mobiliário moderno em Los Angeles – tudo com o objetivo de absorver o máximo de conhecimento para fundar a própria empresa. No paralelo, seguia desenhando e pesquisando. “Percebi que, se delegasse a produção a uma fábrica e dependesse de lojas 68 para vender, minhas peças atingiriam preços inacessíveis. Isso vai contra um dos princípios do design industrial, que é oferecer um custo-benefício justo.” Para resolver a equação, Gustavo traçou um caminho de autonomia.
“Em 2013, um amigo arquiteto me levou para visitar uma oficina de marcenaria que estava montada e sem uso em Petrópolis. Negociei com os proprietários e, na semana seguinte, já havia me mudado para a cidade e ocupado o local.” No começo, o designer confeccionava os móveis sozinho. Com o tempo, conseguiu contratar colaboradores e ganhar escala. Hoje, a fábrica soma 1.200 m2, distribuídos em dois galpões com setores de marcenaria, estofaria, administração, estoque e expedição, além de caminhão próprio. No catálogo, figuram cerca de 50 itens, vendidos diretamente pelo ateliê ou pela plataforma Boobam. Todos os anos, cinco ou seis lançamentos entram para o portfólio.
Quando Gustavo concebe uma nova peça, quase sempre desenvolve também uma família: o mesmo conceito ganha diversos desdobramentos. É o caso da linha Benjamin, composta de poltrona, chaise, cadeira, banco, mesa de centro e lateral. “Procuro desenhar algo que perdure e faça sentido. Cada projeto exige muito tempo e dedicação. Na hora que chego a uma solução que me agrada, seja ela de estrutura, forma, estética ou combinação de materiais, aproveito para aplicar a mesma proposta a vários produtos”, explica.
INSPIRAÇÃO EM ELEMENTOS DA ARQUITETURA
Entre suas maiores referências no design de mobiliário, ele cita os mestres do modernismo brasileiro, como Joaquim Tenreiro, Lina Bo Bardi, Jorge Zalszupin, Sergio Rodrigues e Ricardo Fasanello, porém diz se inspirar ainda mais na vertente arquitetônica do movimento. “Os pilotis, os espaços abertos, o equilíbrio entre leveza e peso, os grandes volumes de concreto, a matéria-prima exposta, sem adornos e enganações, é isso o que me encanta.” Em suas criações, a influência fica evidente nas estruturas deixadas à vista – tão bonitas e bem executadas que não precisam ser escondidas.
Lançados recentemente, o carrinho-bar Bobo, a cadeira Orto, a estante Bauman e a poltrona Bernardo expressam o domínio do designer sobre um repertório diversificado de materiais. “Não sou marceneiro ou serralheiro, nunca me defini num material só. Acho importante saber explorar todos eles, usá-los para gerar contrastes que tornam o móvel mais forte e interessante”, explica. A organização atual da fábrica permite que ele se concentre na criação, diferentemente da época em que precisava “jogar nas 11 posições”, como lembra. O sucesso de sua trajetória, Gustavo atribui à mistura de paixão e entrega. “Sou feliz por sobreviver e prosperar de design.”




















