Skip to main content

ODE À VIDA

Para além de qualquer tendência, o design biofísico é sobretudo um convite a um reencontro mais que necessário da humanidade com a natureza.

POR GIULIANA CAPELLO

PARA ALÉM DE QUALQUER TENDÊNCIA, O DESIGN BIOFÍLICO É SOBRETUDO UM CONVITE A UM REENCONTRO MAIS QUE NECESSÁRIO DA HUMANIDADE COM A NATUREZA, EM NOME DA SAÚDE E DO BEM-ESTAR

“Morar e trabalhar em uma casa projetada para ter interação constante com a natureza e a cidade proporciona uma experiência totalmente diferente, muito mais confortável em vários sentidos”, afirma Chan Hua Xin, autor da Residência Cobogó, de 2018, onde vive e mantém seu estúdio, o CHX Arquitetos, em São Carlos, no interior paulista. O projeto, inspirado na arquitetura vietnamita dos anos 2000, é um bom exemplo de design biofílico: “Não é uma casa de volumetria arquitetônica, mas de sensações – parece que estou no meio de uma mata”, diz o autor e morador. Ele lembra que toda arquitetura de qualidade naturalmente incorpora aspectos relevantes do design biofílico. “Ela vai prever iluminação natural e boa ventilação, vai evocar sensações, trabalhar com o natural, com a paisagem.” O que muda, na opinião do arquiteto, são o valor e o lugar que se dá ao paisagismo, por exemplo. “Em nossos projetos, sempre que possível ele é trabalhado com a mesma importância que a arquitetura e tem função na conformação dos espaços, na composição dos planos de fundo e no controle da temperatura e da incidência solar.”

Uma profusão de estudos comprova que “desencaixotar” a humanidade e rever a maneira como projetamos nossos ambientes construídos, adotando princípios do design biofílico, contribui para reduzir os níveis de estresse, pressão arterial e frequência cardíaca; aumentar a produtividade; estimular a criatividade e a empatia; e melhorar o funcionamento cognitivo, entre outras vantagens. Além disso, a ciência vem demonstrando que elementos naturais – madeira, pedra, argila, água, luz natural,  tecidos de linho e algodão –, bem como superfícies com formas orgânicas, sem quinas, oferecem conforto aos nossos sentidos, gerando a sensação de tranquilidade.

MAS O QUE É O DESIGN BIOFÍLICO?

Na curta linha do tempo dos seres humanos na Terra, poucos séculos separam nossos primitivos abrigos selvagens dos mais modernos edifícios de concreto e aço. Estima-se que atualmente despendemos cerca de 90% de nosso tempo em ambientes fechados, caixas quase herméticas que pouco ou nenhum contato sensorial nos permitem com o exterior. Dentro de algumas  construções, iluminadas e climatizadas artificialmente, mal é possível saber se é dia ou noite, se chove ou neva lá fora. Em muitos casos, nem mesmo a paisagem avistada pela janela alivia a distância do mundo natural, porque a mancha urbana empurrou para longe o verde das árvores e das florestas.

Hoje sabemos pela ciência que esse desligamento humano dos sistemas vivos – resultado, principalmente, da revolução industrial e da forte urbanização – nos adoece. Afinal, somos parte da natureza, e nosso bem-estar se dá a partir dessa interação inata e instintiva que, ainda nos anos 1960, o psicólogo alemão Erich Fromm chamou de biofilia, algo como “amor às coisas vivas”. Duas décadas depois, o termo se popularizou por meio do biólogo Edward O. Wilson e do professor de ecologia social Stephen Kellert, ambos americanos, que reforçaram a relação entre urbanização e desconexão do ambiente natural.

Enquanto o conceito de biofilia acumula algumas décadas de existência, o design biofílico – que corresponde à inserção da biofilia na arquitetura e no design de interiores – ganhou musculatura poucos anos atrás, como um dos reflexos da Covid. “Depois da pandemia, muitas pessoas passaram a buscar mais contato com a natureza e a perceber os benefícios que isso traz para nosso bem-estar físico e mental. É o que explica, por exemplo, a maior procura por viagens a refúgios rurais e o aumento do uso de plantas e materiais naturais na decoração”, avalia a arquiteta, paisagista e ilustradora Aline Najar, professora nos cursos de Paisagismo e Design de Interiores da Escola Panamericana de Artes de São Paulo. 

“Estudos mostram que até mesmo a experiência indireta, como olhar para imagens de paisagens naturais ou estar em um ambiente com materiais que simulam a natureza em suas cores e texturas já auxilia as pessoas”, completa a paisagista. E ainda há os serviços ecossistêmicos proporcionados pela natureza quando a integramos aos espaços construídos: as plantas melhoram a qualidade do ar, servem de barreira aos ruídos urbanos e à poluição do ar, aumentam o conforto térmico etc. A água, por sua vez, inserida na forma de fontes e espelhos d’água, pode reduzir a temperatura nas áreas internas e resultar em espaços mais frescos, contemplativos e de relaxamento.

Posts relacionados

Deixe um comentário