Que a natureza tem os próprios designers nos quais os humanos se inspiram não resta a menor dúvida. Só que eles vão muito além do celebrado e festejado João-de-Barro.
A natureza é pródiga em aves e animais construtores, verdadeiros operários em construção para aqui lembrar um belo e antológico poema de Vinicius de Moraes. Nele o poeta dizia que “era ele que erguia casas onde antes só havia chão/ como um pássaro sem asas ele subia com as casas que lhe brotavam da mão”.
O operário sem asas, mal sabia o poeta, sempre teve a concorrência de operários com asas, que desde tempos imemoriais se esmeram em finas técnicas de construção, embora a fama fique apenas para o já citado João-de-Barro. Alguém aqui, por exemplo, já ouviu falar do fabuloso “tecelão social”, que vive em regiões específicas da África e cuja variação sul-americana atende pelo nome de japim-soldado ou simplesmente soldado?
Essa espécie “obreira” constrói um ninho em forma de bolsa, milimetricamente tecida, e, muitas vezes, cria um aglomerado de palha que é, na verdade, um condomínio de vários ninhos da espécie. Moradia coletiva, em outras palavras. Especificamente o “tecelão sociável” é encontrado na África do Sul, em Namíbia e Botswana, e constrói grandes ninhos comunitários compostos que se assemelham a cabanas completas com um telhado inclinado de palha, que derrama a água da chuva. Esses ninhos são tão grandes que vergam árvores enormes, com algumas “construções” pesando até uma tonelada e medindo até 6 metros de largura e 3 de altura.
Outro exemplo curioso é o caramancheiro, pássaro nativo da Oceania com hábito curioso e, digamos, romântico. Os machos constroem verdadeiros ninhos de amor, decorados com plantas e frutas. Quanto mais colorido o ambiente, mais atraente ele fica aos olhos da fêmea. E, como denuncia seu nome, o caramancheiro vive próximo a uma árvore chamada caramanchão que, aqui entre nós, a grosso modo, designa estruturas leves erguidas em parques ou jardins, de madeira ou metal, e que se pode cobrir de vegetação ou flores previamente escolhidas para se enredarem na estrutura.
Após nossa rápida “aulinha” de jardinagem, vou voar até outro pássaro construtor. É a andorinha-da-testa-branca, mais compacta e de cauda curta, que improvisa seus ninhos bem traçados até sob pontes, passarelas, penhascos e desfiladeiros. Geralmente se destaca dentro de bandos de outras andorinhas com seus tons alaranjados e pode ser encontrada na América do Sul e, muito mais, na América do Norte. Tem como característica a habilidade em construir ninhos com materiais como fibras, musgo e palha.
Já um pássaro com imponência no nome e nos hábitos de construção é o Montezuma oropendola, que constrói seu ninho de forma criativa, usando ramos, palhas e fibras para criar uma estrutura forte e segura. Ele geralmente coloca o abrigo em cavidades ou fendas nas árvores ou em penhascos, protegendo-o de predadores. O pássaro Montezuma também é daqueles que transcendem a habilidade de construção, usando suas garras e bico para moldar e amarrar os materiais de forma eficiente.
E, se falamos de pássaros que constroem bem nas alturas, não podemos deixar de fora de nossa lista os ninhos do Jaçanã-africano, que constrói na superfície da água e mistura a beleza das construções com simplicidade, atributos almejados até pelos mais disputados designers humanos. As construções rijas, feitas com uso de ramos, folhas e outros materiais flutuantes, são bem resistentes ao vento e a correntezas, permitindo que o pássaro mantenha seus ovos e filhotes seguros e protegidos.
Para tentar fazer com que esse texto fosse mais poético, eu me ative aos construtores com asas, mas, para finalizar, homenageio os operários da natureza que ficam no chão, como as simpáticas figuras dos castores, também considerados pela botânica como uma espécie de engenheiros do meio ambiente, já que os seus abrigos costumam ser em áreas elevadas dentro de rios e criados por lama, pedras e árvores, com entradas subterrâneas que dificultam o acesso de predadores. No entanto, tem a particularidade de manter um ambiente seco no interior para abrigar os filhotes. Os habilidosos castores também constroem diques e represas para diminuir a força da correnteza e evitar que suas casas sejam carregadas ou inundadas.
Tanto design caprichado e caprichoso na natureza também constitui o que fazem aranhas, abelhas, cupins e formigas, sem falar na peculiar mariposa Cyan, a que cria uma gaiola sofisticada com os pelos que produz em sua fase de desenvolvimento para se proteger. A estrutura é forte o suficiente para equilibrar o casulo no centro, suspenso por fios de seda produzidos pela lagarta, pelo tempo necessário para ela se transformar em mariposa sem correr risco de ser pega por predadores.
Como se vê, de pássaros a insetos, passando por animais vertebrados, a natureza sabe fazer com que tudo que seja um pouco sólido permaneça no ar… Para parodiar aqui o título de um clássico do escritor americano Edmund Wilson.
Por Ricardo Soares – escritor, roteirista e diretor de TV. Publicou 10 livros, dirigiu 12 documentários.

















