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SERGIO RODRIGUES, PARA VESTIR

Desenhos feitos à mão pelo mestre do modernismo e detalhes da construção de seu mobiliário serviram de inspiração para que o estilista André Namitala, da
marca carioca Handred, criasse uma coleção de roupas em homenagem ao arquiteto e designer, realizada em parceria com o Instituto Sergio Rodrigues.


POR LÚCIA GUROVITZ

Não há dúvida de que Sergio Rodrigues é uma grande referência para quem trabalha com arquitetura e design de mobiliário no Brasil. Graças à coleção lançada pela marca carioca Handred, do estilista André Namitala, na São Paulo Fashion Week de novembro de 2023, a influência do mestre do modernismo chegou com tudo ao universo da moda. Pense em estampas que combinam diversas perspectivas de interiores, saias com volumes produzidos por meio de técnicas de estofaria e vestidos cujos bordados reproduzem a trama da palhinha. Esse cruzamento entre conceitos da produção moveleira e a linguagem da alta costura é resultado de uma intensa troca de conhecimento entre André e o Instituto Sergio Rodrigues ao longo de dois anos. Embora o estilista já fosse admirador e colecionador da obra do designer há tempos, a parceria teve início com uma ajudinha do acaso. “Um dia, estava na loja e fui marcar a bainha da calça de um cliente. Começamos a conversar e ele me contou que trabalhava no Instituto”, lembra André. A oportunidade não foi desperdiçada: pouco depois, acontecia o primeiro encontro com o designer Fernando Mendes e a administradora Renata Aragão — ele, presidente, e ela, diretora-executiva da Instituição.

Acima, croquis de André Namitala para a coleção.

O Instituto Sergio Rodrigues funciona como guardião da memória e do legado do designer: a associação sem fins lucrativos foi fundada em 2012, enquanto o mestre ainda estava vivo, e ocupa o sobrado onde ele morou e, mais tarde, instalou seu escritório. “Curiosamente, a ideia de criar o Instituto nasceu em um evento de moda”, conta Fernando. Na edição do Fashion Rio realizada em janeiro de 2012, a cenógrafa e curadora Mari Stockler montou uma exposição no Píer Mauá com móveis, ilustrações, fotografias e outros itens do acervo do designer. “A mostra teve grande repercussão, e ali percebemos que seria importante existir uma organização que protegesse a obra do Sergio”, afirma Fernando. Segundo ele, o principal ativo da entidade é o arquivo documental e iconográfico, que compreende seis décadas de carreira, além de passagens da vida pessoal do mestre. O material é disponibilizado para estudantes e pesquisadores e ajuda a compor o manancial de dados em exposições, trabalhos acadêmicos e publicações, como o livro Sergio Rodrigues em Brasília, de Marcelo Mari, recém-lançado pela Editora Olhares. “A parceria com a Handred representa a primeira vez em que o Instituto faz um contrato com viés comercial, que irá contribuir para a manutenção das nossas atividades”, diz Fernando. “Não temos uma fonte de renda contínua.”

Acima, camisa de seda bordada e vestido com a estampa Perspectivas.

Durante os meses em que mergulhou nos arquivos, André encontrou portas totalmente abertas. “Fernando e Renata me receberam com muita generosidade. Fazia a pesquisa após meu horário de expediente, à noite, e eles sempre estavam por lá para me apoiar”, afirma. Além de se inspirar na forma como Sergio projetava os móveis e de incorporar madeira e couro às roupas da coleção — a Handred só trabalha com materiais naturais, como linho, algodão e seda —, o estilista desenvolveu três estampas: Perspectivas, composição com diversos desenhos de interiores feitos pelo designer; Personagens, que mostra o lado ilustrador do mestre e junta figuras divertidas em preto & branco; e Cuiabá, o xadrez baseado no espelho de mesmo nome. “Busquei caminhos menos óbvios para homenagear o traço do Sergio”, diz.



O contato inicial de André com a obra do designer aconteceu em seu primeiro emprego na área de moda, aos 17 anos. “Minha chefe tinha uma cadeira Kilin e logo entendi que estava diante de algo muito sofisticado”, lembra. “Aquele móvel simples, sem adornos, feito de apenas dois materiais, madeira e couro, me ensinou o que é acabamento”, explica. Assim que juntou dinheiro suficiente, o estilista comprou uma igual. Hoje, seu apartamento em Copacabana é recheado de móveis do pioneiro do modernismo, a maioria peças vintage, compradas em leilões e antiquários. Devido à parceria com o Instituto, as lojas da Handred também foram preenchidas com móveis de Sergio Rodrigues. Após o desfile de lançamento das roupas, realizado na Dpot da Alameda Gabriel Monteiro da Silva, na capital paulista, a colaboração teve ainda dois desdobramentos: um minidocumentário com registros da pesquisa e criação, disponível no YouTube da marca de moda, e a publicação de um fanzine com textos de André, Fernando e das curadoras Adélia Borges e Ligia Nobre, entre outros nomes. Para o Instituto, a agito gerado pela coleção funcionou como aquecimento para as futuras ações ligadas ao centenário de Sergio, em 2027. “Parece que ainda falta muito tempo, mas, na verdade, precisamos correr”, afirma Fernando. “Estamos nos preparando para, no mínimo, lançar um livro e montar uma exposição.”


Ao lado, vestido de seda Personagens.

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