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MADE IN BRASIL

Viajar pelo Brasil é ao mesmo tempo estudo e processo criativo para Giácomo Tomazzi. Sempre em busca de novos materiais e saberes bem brasileiros, o designer enxerga o desconhecido como a chance de aprender cada vez mais.

POR JULYANA OLIVEIRA

Do quartzo à palha natural, o arquiteto Giácomo Tomazzi explora novos materiais com avidez, sedento por descobrir diferentes texturas, brincar com maleabilidade e rigidez. Suas peças exibem traços brasileiros inquestionáveis, fruto de suas incursões pelo País. O design surgiu na vida dele de um jeito leve, com tempo e espaço para experimentar, enquanto a arquitetura seguia como atividade principal. Até que, em 2017, Giácomo mudou de carreira, passando a dedicar-se totalmente ao design de produtos. Sorte a nossa! O que aconteceu nos últimos sete anos você confere no bate-papo a seguir.

Na imagem de capa, a Poltrona BO na versão de palha de carnaúba, aço inox e couro fibra de abacaxi. A peça foi produzida em tiragem limitada com apenas 10 unidades. Acima, o designer Giácomo Tomazzi. Fotos: Raul Fonseca.

Nós temos muitas matérias-primas a serem exploradas, muitos saberes, uma cultura riquíssima e diversa

&Design:: Como nasceu o Giácomo designer?
Giácomo:: Eu sou arquiteto de formação, mas digo que é por paixão. Eu passei a ter os inputs de design ainda durante a faculdade. Minha professora orientadora tinha morado na Suécia, então logo comecei a ter contato com esse universo, o que foi crescendo
durante o exercício da profissão. Ingressei em um escritório de arquitetura, atuando com projetos residenciais e comerciais. Meu início foi em Florianópolis, e em 2005 eu me mudei para São Paulo, onde trabalhei com Marcelo Rosenbaum e Fernanda Marques. Nesses escritórios, eu pude ter contato com as marcas, conhecer o mercado de design, ver como é que funcionava e tal. E tive a oportunidade de ir para Milão, com a Fernanda, em 2011. Então,
eu conheci mais o mercado. Depois, comecei a participar de concursos, fazer uma peça, fazer outra. Assim, sem compromisso com a venda. Era o exercício de fazer design, investigar os materiais, as linguagens. O início foi muito experimental. Trabalhei com pallets reciclados, madeira reciclada – até fiz uma exposição desses materiais em uma galeria. Desde 2011, eu vinha fazendo incursões e experimentos, de forma muito orgânica e sem grandes pretensões. Até que em 2017 decidi focar no design e explorar materiais brasileiros, as pedras brasileiras, quartzito, quartzo… Participei da MADE em 2017, e a partir daí não parei mais. Deixei a arquitetura e me dediquei completamente ao design de produto.

&D:: Você se dá bem com diferentes tipos de materiais. Como é essa experimentação?
GT:: Eu sempre me coloco no lugar de quem desconhece. A ideia é me permitir fazer novas explorações algumas vezes durante o ano, experimentar novos materiais e incorporálos ao meu portfólio. Eu gosto de navegar por mares desconhecidos. Com a Mekal, por exemplo, foi um trabalho bem interessante: a experimentação do aço inox com materiais orgânicos, sustentáveis, como a palha de seda feita no Brasil e a palhinha natural, aquela palhinha indiana tramada por um artesão ali na esquina da Alameda Gabriel Monteiro da Silva [polo de decoração na cidade de São Paulo]. Então, é um jeito de trabalhar novas linguagens. Eu não me limito ao material, mas o desafio de trabalhar com novos materiais é o que me move. Eu sempre estou pesquisando opções sustentáveis, brasileiras, coisas que são muito genuínas, únicas. Essa é uma investigação constante.

&D:: Quando fala de investigação e pesquisa, como você vai atrás dessas referências? E como é seu processo criativo?
GT:: Não é um processo linear. Ele pode se dar em uma viagem, em uma exposição, nas cidades que eu visito. Sendo designer, eu passei a conhecer muito mais o Brasil. E isso se tornou quase uma obsessão: ir atrás de lugares que são únicos, onde eu posso encontrar algo genuíno. É uma busca constante
por novas referências, em viagens, na natureza, na cidade, na arquitetura, na arte.

&D:: Não há dúvidas quanto à riqueza brasileira, certo?
GT:: Nós temos de reforçar a valorização do que é ser brasileiro, do que é nacional. Nós temos muitas matérias-primas a serem exploradas, muitos saberes, uma cultura riquíssima e diversa. Eu acho importante, como designer, olhar para isso e utilizar todo esse arsenal cultural nas criações. Viajando para outros países, cada vez eu tenho mais certeza de que precisamos olhar para dentro, para as referências brasileiras, naturais, nossa história e nossos povos. Aí existe um caldo bem interessante, boas referências para serem exercidas no design.

&D:: Quem você considera suas referências brasileiras hoje?
GT:: Eu tenho olhado muito para um Brasil mais ancestral. Nossa relação com nossa história, com o Cosmos, nossa evolução, o que ficou perdido no passado e pode ser resgatado. Essa busca pela essência, a essência das coisas.

Da coleção Solar, a mesa Alvorada e a cadeira Sol – esta última exibida durante a Semana de Design de Milão 2024.

&D:: Os materiais que você utiliza
possuem algo em comum: são sustentáveis. Como essa questão influencia o seu processo criativo?
GT:: Eu vejo de duas formas. A sustentabilidade, para mim, tem a ver com durabilidade, com perpetuar esse produto. Que ele não seja descartável, mas que passe de uma geração para outra. Então, são peças que duram no tempo. Outra coisa é você criar produtos que, caso sejam descartados, possam ser desmembrados. Então, que o aço inox possa ser reintroduzido na indústria, que ele possa ser reciclado. O material orgânico, como a palha natural ou a palha de seda, se você o coloca na terra, ele não vai poluir, vai ser incorporado na natureza. Então, eu tenho pensado cada vez mais em criar possibilidades de o design ser desmembrado.

&D:: Suas peças já são exportadas para os Estados Unidos e a Europa. Existem novos planos relacionados à internacionalização da marca?GT:: O estúdio está olhando para mercados fora do Brasil. Já existe a procura orgânica de clientes. Então, isso está se intensificando. Estamos buscando consolidar cada vez mais as parcerias com as marcas já estabelecidas e explorando novos mercados, como Ásia e América do Norte.

&D:: Quando pensa em tudo que já construiu até aqui e olha para o futuro, como você enxerga seu propósito como designer e como marca?
GT:: Para mim, o design é uma ferramenta para falar de processos, de materiais, de pessoas. Para contar histórias. Histórias que sejam inspiradoras, que  emocionam, que toquem. Lógico, o meu papel como designer é criar peças que sejam funcionais, mas eu quero adicionar novas camadas. Eu tenho um trabalho bem autoral, que eu quero explorar mais, com peças que tenham um valor estético simbólico tão importante quanto a função.

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