
POR JANAÍNA SILVA
EM PORTO FELIZ, interior paulista, a casa conceito Alvorada3520 exibe arquitetura minimalista com um toque oriental. O setor social, com espaços extensos e abertos, estimula o convívio – dentro e fora, na área de lazer com varanda, piscina e churrasqueira –, mas também permite reorganizar o layout usando divisórias ou até mesmo o mobiliário. Exemplos são o home office e a cozinha, que podem ser isolados ou integrados ao restante.
Apesar de contar com ar-condicionado, a construção de 600 m2 foi arquitetada para não depender dele. Em toda a fachada, ritmada por pilares de madeira, as persianas externas são controladas individualmente ou em conjunto, de forma automatizada. O acessório tem caráter estético e de privacidade, mas também barra os raios solares, o que dispensou vidros com tratamento térmico. “Quando o sol aquece os vidros de um imóvel, o calor é irradiado para dentro. A cortina interna quebra a luz natural, mas não o calor. Quem faz isso é a persiana externa”, afirma a arquiteta Thais Keiko Monteiro, autora do projeto e fundadora da incorporadora D76, responsável pela execução. Além disso, quando as portas e janelas envidraçadas são descerradas, a ventilação natural deixa a temperatura agradável mesmo quando o dia vai quente lá fora.
A casa ainda produz a energia que utiliza e cuida dos resíduos que origina. O sistema fotovoltaico é capaz de gerar 1.500 kwh/mês de energia elétrica; o método solar de aquecimento de água atende os chuveiros; a água pluvial coletada é tratada e, então, reutilizada nas descargas e na irrigação; as sobras orgânicas da cozinha vão para uma composteira elétrica; os vasos sanitários têm trituradores de papel (gasta-se menos água) e existe um biodigestor para tratar o esgoto.
E há também os atributos que fizeram diferença na obra, como os acabamentos. Os pisos, por exemplo, se restringem a dois entre as áreas externa e interna, o que reduziu as perdas no assentamento. Já os granitos das bancadas são todos nacionais. “Não apenas porque essas pedras são muito resistentes e elegantes com o acabamento levigado, mas também porque, para uma casa sustentável, faz todo sentido diminuir ao máximo a distância e o transporte dos materiais”, explica a arquiteta.
A Alvorada3520 é resultado de cinco anos de pesquisa de materiais e processos somados a 20 anos de atuação profissional – de Thais e do engenheiro Marcelo Pulcinelli, então sócio da D76. “A vivência anterior de todos os desafios da construção civil aguça o olhar crítico para pensar diferente”, avalia Thais. Esse projeto é chamado de casa conceito porque é a materialização de conhecimentos e técnicas que podem ser replicados, sem que se copie o projeto em si.
Implantação e sistema construtivo
Uma avaliação profunda dos fatores bioclimáticos no local orientou o posicionamento no terreno. Como lembra Thais, a construção precisa integrar-se à natureza, em vez de brigar com ela. “Por isso, analisamos não somente a insolação, mas também a temperatura do solo, a umidade, a direção e a velocidade de ventos e chuvas. A casa é desenhada para tirar proveito dessas condições, de forma que não seja abafada nem fria.” Entre os resultados obtidos ainda na fase de estudos com o modelo 3D, o imóvel é termicamente eficiente durante 90% do ano, com a temperatura interna variando de 20 oC a 24 oC, independentemente do que marca o termômetro na área externa.
Enquanto a Alvorada3520 foi concluída em oito meses, entre julho de 2023 e fevereiro de 2024, seriam necessários 18 meses para uma construção convencional. Por trás do curto tempo está o modelo construtivo baseado em sistemas pré-fabricados, com destaque para a madeira engenheirada. “Essa estrutura é mais cara que outra de concreto, porém ela é muito mais rápida e precisa. Sendo mais rápida, o tempo de obra é menor e, por consequência, caem os custos com equipes, transporte, refeição e moradia”, raciocina Thais.
O que não se pode – ou não se deve – é, ao longo dos trabalhos, alterar o projeto e o que está ligado a ele, como aberturas e pontos de elétrica e de hidráulica. Qualquer modificação eleva o custo final. Isso porque a execução é planejada de ponta a ponta, com uma decisão conduzindo a outra. Seguindo essa cartilha, uma casa com tecnologias pré-fabricadas custa mais ou menos o mesmo que uma tradicional, conforme a arquiteta. “As escolhas têm de ser pensadas em conjunto e antecipadamente”, enfatiza.
Menos entulho, menos desperdício
Ao optar por sistemas pré-moldados, Thais também mirou na redução de resíduos, já que pilares e vigas de madeira engenheirada chegaram prontos para a montagem. “Pelo método convencional, com estrutura de concreto moldada inloco, é possível ter uma obra organizada. Entretanto, ela nunca será limpa como outra com estrutura de madeira”, compara. O raciocínio se aplica igualmente às paredes, que, no caso da Alvorada3520, foram realizadas não com blocos e argamassa, como manda a tradição, mas com steel frame, encaixando-se placas cimentícias e de gesso acartonado em perfis de aço galvanizado.
Mais um item que desembarcou no canteiro pedindo apenas colocação foi a piscina, um modelo com spa integrado revestido internamente de pastilhas cerâmicas. Essas e outras soluções – como a destinação de materiais para reciclagem – contribuíram para que a obra inteira gerasse apenas cinco caçambas de entulho.
Análise do ciclo de vida e impacto ambiental
A mão de obra para as etapas de fundação, revestimentos e instalações foi da região, o que mitigou deslocamentos. Já a maioria dos materiais envolvidos fez parte de sistemas construtivos – sistemas completos e complexos, que só estavam acessíveis na cidade de São Paulo, a 90 km da obra.
Se por um lado o transporte desses itens poderia jogar contra o potencial sustentável da solução, por outro mais fatores entraram na conta, “em busca do melhor equilíbrio”, como lembra a arquiteta. Ela salienta a importância da análise do ciclo de vida dos materiais: a alternativa mais sustentável de produto é aquela que considera o carbono e os resíduos gerados durante a fabricação e a instalação, bem como a rapidez do processo e as distâncias percorridas.
Todas os recursos projetuais e tecnologias que diminuem o impacto ambiental da Alvorada3520 estão disponíveis hoje e serão cada vez mais determinantes, na opinião de Thais. “Quando as pessoas dispuserem de opções sustentáveis, desde a construção, a ocupação e a manutenção, elas darão a esse aspecto um peso maior na hora de escolher um imóvel.