Marcas que buscam impactar positivamente a sociedade e abraçar a diversidade veem no design uma ferramenta útil para estreitar laços com empresas e consumidores.
POR ROBERTO GUERRA
A carteira de clientes do Estúdio QUE não é nada tímida. Entre as muitas organizações que já contrataram essa agência de produtos customizáveis – que tem o design em seu DNA –, figuram a Meta (ex-Facebook), o Itaú, a Danone e o Google, por exemplo. Atentas às transformações na sociedade, essas e outras corporações estão entendendo que ter uma postura de responsabilidade social já é critério de escolha para uma parcela significativa dos consumidores. Parcela que só deve crescer. Logo, faz sentido apostarem em fornecedores que oferecem mais que um serviço de qualidade – oferecem também inclusão e inovação.
É isso o que faz o Estúdio QUE, aberto em São Paulo, em 2019, sob o nome La Casa de Carlota SP. Com quadro de dez funcionários, a empresa investe na confluência de talentos portadores de diferentes condições cerebrais para alcançar resultados inovadores e impulsionar o design brasileiro. Fazem parte da equipe de criação seis profissionais com paralisia cerebral, síndrome de Down, autismo e outras deficiências intelectuais. “Por contarmos com pessoas que não estão ‘presas’ às regras e aos padrões do mundo da comunicação, existe uma liberdade no criar e no sentir que nos permite entregar trabalhos verdadeiramente únicos”, avalia a diretora geral, Luiza Laloni, especialista em branding.
Seu diferencial está em incluir pessoas que talvez não tivessem a oportunidade de exercer sua criatividade em outros empregos
Entre os criativos do estúdio, os olhares e os estilos são diferentes – e respeitados –, assim como as habilidades, que podem ser para a tipografia, o retrato ou a ilustração abstrata, entre outras. Como qualquer agência, o Estúdio QUE conta com processos e infraestrutura para entregas de qualidade. Seu diferencial está em incluir pessoas que talvez não tivessem a oportunidade de exercer sua criatividade em outros empregos. “É claro que temos dificuldades e que muitos clientes não entendem a excelência do que fazemos até a entrega ser feita. Mas essa convicção sempre chega”, orgulha-se a empreendedora Luiza Laloni. O design, na opinião dela, é uma ferramenta eficiente para tornar
o mundo mais inclusivo, ao passo que a inclusão pode deixar o design mais criativo.
Cada um dos projetos de design gráfico é submetido a uma pré-avaliação. Os que são aprovados nessa primeira peneira seguem para uma etapa de desenvolvimento de estratégias, compartilhadas com o grupo e usadas em uma oficina “totalmente analógica e mão na massa”, segundo Luiza. As criações passam, então, para a pós-produção gráfica, que dá vida àquilo que o cliente pediu. “Tudo o que sai do Estúdio QUE foi criado coletivamente, sem exceções. O que nos faz diferentes e especiais é a forma como enxergamos e praticamos a criatividade – coletiva e diversamente”, enfatiza.
Luiza diz que, ao contrário do que ela imaginava, o mercado de comunicação de São Paulo vem sendo surpreendentemente aberto à sua proposta. “A construção social em torno de pessoas com deficiência ainda é muito dura, mas cada vez mais estamos quebrando essas ideias e atendendo a grandes marcas engajadas nas pautas de inclusão e diversidade.” A receptividade do universo corporativo contribuiu para que, poucos meses antes de completar seu quinto ano no Brasil, a agência passasse por uma mudança de marca e ampliação do escopo de atuação. Deixou de ser o braço brasileiro de uma empresa espanhola de design gráfico para se apresentar como o Estúdio QUE e realizar projetos inovadores ao lado de clientes já conquistados por aqui.
INFORMAÇÃO E DOAÇÃO EM UM SÓ PRODUTO
Outro exemplo de empresa que traz a responsabilidade social em seu modelo de negócio é a Akio 2051, grife adepta da social fashion. O publicitário paulista Reinaldo César Jr., que montou o negócio em 2022, conta que 10% do valor bruto resultante da venda de suas coleções de camisetas são doados a instituições sociais de pouca visibilidade – como o Centro de Equoterapia Dr. Adler, de Mairiporã, SP, e o Hospital Casa do Caminho, de Araxá, MG –, cujas causas inspiram as estampas. “A ideia é contar histórias relacionadas à realidade de cada instituição. Essas histórias têm de necessariamente estabelecer uma conexão forte com as pessoas. Por isso, investimos em um design lúdico”, diz o empreendedor.
Os desenhos carregam atributos e valores que a Akio 2051 quer expressar, sendo a comunicação visual responsável por criar conexões emocionais com quem se identifica com pautas sociais e de inclusão. A coleção Flor de Fogo, por exemplo, nasceu da história real de um garoto de 7 anos assistido pelo Lar da Caridade, mais conhecido como Hospital do Fogo Selvagem, de Uberaba, MG. Vítima de pênfigo, doença também chamada de fogo selvagem e caracterizada por lesões cutâneas dolorosas espalhadas pelo corpo, o menino se refugiava do sofrimento mergulhando no mundo da imaginação enquanto jogava videogame. Essa cena foi o bastante para os designers da Akio 2051 elegerem a flor-de-fogo, uma das armas mais poderosas de vários games, como estampa.
A coleção Amor Infinito, por sua vez, usa motivos minimalistas para retratar a paixão dos tutores por seus animais de estimação. O design encontrou inspiração no trabalho conduzido pela Associação Protetora dos Animais Abrigo Flora e Fauna, de Brasília, DF, que acolhe cães e gatos em situação de risco, vítimas de abandono ou maus-tratos.
“Por que não usar a moda como forma de expressão? Por que não se vestir bem e ainda ajudar o próximo? Desses questionamentos que sempre me fiz surgiu a Akio 2051”, relata Reinaldo. E continua: “Ficar bonito e ajudar quem mais precisa. Ficar bonito de corpo e alma. Esse é o propósito da marca”.